É cada vez mais evidente que os padrões de consumo deixaram de ser apenas respostas temporárias a contextos de crise. O comportamento do consumidor transformou-se estruturalmente e, em muitos casos, de forma irreversível. A disrupção deixou de ser excecional, para representar o novo normal.
Segundo a McKinsey, os consumidores tornaram-se mais seletivos, conscientes e auto-suficientes. Há uma procura crescente por conveniência, autenticidade e experiências que reflitam valores pessoais. E esta realidade é transversal a diferentes mercados e gerações.
Um dos sinais mais claros desta evolução é a ênfase na autonomia. De acordo com o Global Consumer Trends Report, 68% dos consumidores valorizam a capacidade de gerir de forma independente a sua saúde, finanças e estilo de vida.
A consciência ambiental e social também se consolidou. Segundo um estudo do Global Banking & Finance Review, 88% dos consumidores esperam que as marcas sejam transparentes nas suas práticas e na forma de comunicar e 74% identificam o greenwashing como um fator dissuasor de compra. Estas exigências são particularmente significativas na Geração Z, que não hesitam em abandonar as marcas que não refletem os seus valores.
Naturalmente, o bem-estar tornou-se parte integrante da identidade do consumidor moderno. Segundo a Euromonitor, mais de 50% dos consumidores acreditam que estarão mais saudáveis nos próximos 5 anos. Essa expetativa está alicerçada no aumento do uso de tecnologia pessoal para monitorização de saúde e na procura por produtos funcionais que combinem nutrição, longevidade e prazer.
Por outro lado, o crescimento do social commerce tem contribuído para redesenhar a forma como os consumidores descobrem e adquirem produtos. Estima-se que mais de 60% das compras digitais sejam influenciadas pelas redes sociais, com destaque para plataformas como TikTok e Instagram. Na verdade, a ligação entre conteúdo, entretenimento e consumo nunca foi tão direta e tão poderosa.
Observa-se ainda uma mudança de paradigma nas preferências de marca. As marcas próprias e os chamados “dupes” — versões mais acessíveis de produtos premium — têm vindo a ganhar tração. As marcas próprias da distribuição alimentar já representam cerca de 300 mil milhões de dólares a nível mundial, impulsionadas por consumidores cada vez mais atentos à relação custo-benefício.
A procura por alternativas de pagamento flexível, como o modelo “Buy Now, Pay Later” (BNPL), também se generalizou, sobretudo entre consumidores jovens com menor estabilidade financeira, embora sejam soluções que oferecem conveniência e colocam novos desafios éticos e financeiros às marcas.
Em suma, não se pode nem deve generalizar o comportamento do consumidor, em face da multidiversidade de preferência, mas não será arriscado afirmar que é mais informado, mais exigente e mais estratégico. Escolhe com base em valores, mas também em preço. Espera inovação, mas exige simplicidade. Quer personalização e recusa intrusão. A lealdade é cada vez mais volátil e o poder está do lado do consumidor.
Perante este cenário, as marcas precisam de agir com agilidade e profundidade. Investir em escuta ativa (apoiada em dados e IA), reestruturar portefólios com base em valor real e reforçar a personalização são passos essenciais. Mais do que nunca, compreender o consumidor não é uma vantagem — é uma condição de sobrevivência num mercado em constante reinvenção.
Pedro Celeste, Professor na CATÓLICA-LISBON