Num ecossistema digital em que a informação circula à velocidade de um clique, a autenticidade tornou-se um valor estratégico para as organizações em geral, empresas e respetivas marcas.
Se, num passado recente, bastava dominar os meios de difusão, hoje o público – sobretudo as gerações mais jovens – avalia, compara e penaliza rapidamente qualquer tentativa de manipulação ou de comunicação menos transparente.
Dados recentes ajudam a ilustrar esta realidade: um estudo da Edelman Trust Barometer 2024 revela que 67% dos consumidores da Geração Z afirmam ter deixado de seguir ou mesmo boicotado marcas que consideraram pouco autênticas. No mesmo alinhamento, um relatório, da McKinsey, conclui que mais de 70% dos jovens valorizam mais a coerência entre discurso e prática de uma empresa do que a inovação inerente ao produto.
A questão central do ponto de vista da gestão é que a penalização não se traduz apenas em perda de reputação: traduz-se em perda direta de vendas e numa erosão de confiança difícil de recuperar.
A história recente está repleta de exemplos internacionais de como a falta de autenticidade pode sair cara. Quem não se recorda do caso Volkswagen, com o escândalo “Dieselgate”, que evidenciou como a adulteração de dados ambientais corroeu a imagem de uma marca considerada sólida, resultando em multas superiores a 30 mil milhões de euros e numa quebra duradoura da confiança com efeitos práticos no goodwill da marca, só recuperados cerca de 7 anos mais tarde.
Mais recentemente, campanhas de “greenwashing” – em que empresas comunicam um compromisso ambiental que não corresponde à realidade – têm sido expostas rapidamente por utilizadores atentos nas redes sociais, muitas vezes através da investigação comprovada levada a cabo pelos consumidores. Encontramos múltiplos exemplos na dermocosmética, produtos alimentares, de higiene pessoal ou pronto-a-vestir. Em contrapartida, há exemplos de excelência que mostram este trilho da transparência e muitos estão perto de nós.
Quem desempenha nesta matéria um papel decisivo, embora ambivalente, é precisamente a inteligência artificial (IA). Por um lado, as ferramentas de IA permitem às marcas produzir e difundir conteúdos em larga escala, analisar tendências e personalizar mensagens. Por outro, levantam a questão da verificação: como distinguir entre um conteúdo legítimo e um adulterado? Deepfakes e textos fabricados podem induzir em erro, mas a própria IA está a ser desenvolvida como mecanismo de aferição da verdade, através de sistemas de deteção de manipulação digital ou de validação de dados. Ou seja, a tecnologia pode ser tanto instrumento de distorção como guardiã da autenticidade – dependendo da forma como é usada.
A dimensão pedagógica desta transformação não pode ser ignorada. Cabe às marcas e às organizações perceber que a sua comunicação já não se limita a persuadir: deve educar, esclarecer e assumir uma responsabilidade social. Num mundo em que a literacia digital é crescente, sobretudo entre os mais jovens, qualquer deslize é rapidamente amplificado, enquanto a transparência é recompensada com fidelização.
A conclusão é inequívoca: o futuro da comunicação será julgado pela sua credibilidade e autenticidade. Marcas e instituições que optarem por atalhos, distorções ou meias-verdades arriscam-se a ser excluídas do espaço de confiança. Já aquelas que assumirem a clareza, a coerência e a transparência como valores centrais não só garantirão a sua relevância, como se posicionarão como referências de confiança num mundo saturado de informação.
Pedro Celeste, Professor na CATÓLICA-LISBON